A boa escola: novos paradigmas

Escola Ágora

Escola Ágora

A revista “Time”, de 27 de outubro de 1997, numa reportagem de capa, “What Makes a Good School”, aborda alguns aspectos que considera pontos fundamentais para se fazer uma boa escola. A instrução formal norte-americana atravessou décadas investindo em “receitas” ou “mandamentos” da boa instituição escolar, quase sempre voltados para o tecnicismo que, praticamente, reduzia a pedagogia a uma ciência quase exata… Porém, esboçam-se mudanças quanto a essa visão: surpreendentemente, essa matéria incorpora conceitos humanistas, tais como idealismo, prazer, sonho, paixão, estreitamento das relações entre casa e escola, incorporação de valores formativos, para se obter melhores resultados na tarefa educacional. O bom professor, por exemplo, não é visto, e nem mostrado, como um especialista pronto a executar a tarefa de transmitir seus conhecimentos aos alunos, mas, sim, como alguém que ajuda o aluno a aprender; como um orientador e, principalmente, como um promotor do desenvolvimento humano.

Numa das raras obras em que Jean Piaget aborda o tema, “Para Onde Vai a Educação?”, encomendada pela Unesco e publicada em 1971, ele condena o caráter de trincheiras que se estabelece entre professores e alunos, nas escolas tradicionais. Essa situação, segundo o mesmo mestre, desemboca na “coação social”, a lei do mais forte, o “faça porque eu estou mandando”, que se opõe à “cooperação social”, desejável na formação de crianças e jovens, que aguça o senso crítico, que promove o crescimento individual, que transforma professores e alunos em parceiros na construção do trabalho. Atenção, porém: parceiros e, não, colegas. Professores e alunos têm funções sociais bastante distintas, com direitos e deveres diferenciados.

A reportagem fala, também, em preparar os alunos não apenas para continuarem seus estudos, mas para a vida. Apesar dessa idéia ser bastante difundida entre nós, estando, mesmo, um tanto desgastada, ela se refere a um conceito fundamental: a formação do indivíduo para a cidadania. Cada vez mais, caberá à escola dizer a que veio, na tarefa de construção da sociedade.

Classes menores também merecem destaque na matéria da revista – segundo ela, há estudos que mostram que grupos pequenos, embora custem mais, são mais produtivos, permitem maior interação pessoal entre professores e alunos e destes entre si.

Em meio a elogios ao esquema de período integral, à valorização do professor que se envolve profundamente com seu projeto de trabalho (e que está bem capacitado para desenvolvê-lo), à importância da sintonia entre casa e escola, vai se tornando nítido o pano de fundo do artigo: há que se mudar a estrutura da escola, as transformações desejadas são estruturais e, não, conjunturais. Deve-se buscar o novo e, não, a novidade.

Há treze anos vivendo uma experiência educacional bastante diferenciada, concretizada através da Escola Ágora, creio que posso ampliar o olhar sobre algumas das questões abordadas pelo texto em questão.

Grupos pequenos de trabalho – quinze alunos, no máximo – são, com certeza, condição prioritária para se implementar uma nova maneira de dinamizar a relação professores-alunos. Numa classe menor, todos se tornam mais próximos, todos se vêem e se ouvem mais – a pequena platéia é, certamente, muito mais encorajadora para oradores inexperientes, a turma menor expõe mais seus conflitos (caminho necessário para resolvê-los), ao invés de encobri-los. Trabalhando com um grupo pequeno, o professor conhece melhor seus alunos, o que permite um olhar mais preciso às necessidades e dificuldades deles, uma agilidade e uma rapidez maiores para a superação das falhas e para os encaminhamentos desejáveis; esses, por sua vez, podem dar voz a seus pensamentos, colocar seus questionamentos, colaborar de modo mais participativo para a construção do seu próprio conhecimento e do de seus colegas.

A questão da cidadania, hoje muito debatida (há, até, aulas de cidadania, em alguns estabelecimentos escolares!), sempre foi incorporada à nossa prática, através de um outro conceito: o do respeito. Nossos materiais não são trancados, nossa biblioteca não tem um funcionário responsável. No entanto, são compartilhados e cuidados por todos os alunos, de primeira a oitava séries, imbuídos de um sentido forte e construtivo de comunidade. Esse trabalho, digamos, “oculto”, de mobilizá-los para um bem-estar coletivo, refaz-se e confirma-se em função do tempo e do espaço que se oferece à convivência – nesse aspecto, o período integral e o horário livre são fundamentais. De que adiantaria falarmos em boas regras de convívio, se não as vivêssemos? Aprender a brincar, a conversar, a errar, a pedir desculpas, a convidar um amigo para compartilhar uma atividade, a vencer a timidez, a respeitar combinados, a inventar, não é fácil, e demanda tempo e espaço. É através dessas situações que os medos vão sendo vencidos, que as regras vão sendo incorporadas, que as relações vão se desenvolvendo, que a cidadania deixa de ser um conceito abstrato e vai se construindo. De que adiantaria o grande espaço físico que possuímos, se não houvesse oportunidade de ocupá-lo, de explorá-lo? Nesse aspecto, os dois termos desse binômio são inseparáveis, um perde a função sem o outro.

Ao finalizar, tento, ambiciosamente, cumprir a difícil tarefa de definir o que seria uma boa escola: um grande espaço vivo, pulsante, dinâmico, onde professores e alunos voltem suas mentes à tarefa apaixonante de construção do conhecimento e seus espíritos à promoção sistemática do ser humano.

Terê Fogaça de Almeida

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